ZOANDO NA CAATINGA

A VOZ DE VALDENIRA


Valdenira é uma paraibana do semi-árido, vivendo na confluência de vários Estados. Ela é da base da base. Não tem computador e me telefona sempre para dar notícias e falar suas impressões sobre muitos assuntos que afetam os brasileiros da caatinga e de todo o país. Coloco aqui sua fala e discuto com ela suas idéias, às vezes muito radicais e críticas, mas quase sempre cheias de razão e divertidas. Acompanhe.

Valdenira a estas horas, de mochila nas costas, está na Marcha do MST. Mas antes de ir mandou um bilhetinho para a redação deste sitio. Acompanhem.

"Minha amiga, saudações a todos. Tô de mochila nas costas e apressada, mas vai aí umas linhazinhas que é pro povo saber como a gente deve mexer o "traseiro".

"Na reunião de quinta-feira aqui na comunidade o pessoal resolveu discutir a história dos juros altos. Porque saiu uma conversa que só quem pagava juro alto no Brasil eram os ricos e a classe média. Pois sim, vão circulando essas idéias que são muito das mentirosas. Quem mais paga juro no Brasil é o pobre mesmo. Se pobre quis algum dia comprar alguma coisa foi tudo na base da prestação. Aí "come" o juro alto, o juro da praça. Cai o juro no lombo do trabalhador. À vista, os vendedores diziam, tem 10% de abatimento. Qual o pobre que tinha dinheiro pra pagar tudo de uma vez? Aí "come" o juro. E quanto maior o juro da praça maior o juro da prestação."

"E como pobre nem sempre tinha renda pra comprovar no crediário ainda tinha os "galegos", os vendedores de porta. Eu tinha umas amigas que diziam assim: gosto mais de comprar no "galego", porque quando a gente num tem o dinheiro naquele mês, ele deixa pro próximo. Os "galegos" diziam assim: não se preocupe não dona, eu sei que você tá aperreada,eu boto sua prestação lá pro fim. E elas necessitadas mesma, coitadas, concordavam. Minha amiga, adivinhe aí o tamanho do juro que elas iam pagar, num terminavam nunca de pagar o "galego".

"Agora dizem que tem crédito baixo pro povo num ficar nas mãos de agiota. Aí você tira o crédito, mas quando vai comprar vê que acabou a história de pagar à vista. Agora é tudo à prestação. Não tem mais desconto de 10% à vista. E ainda dizem que a prestação é sem juros. Minha amiga, "me engana que eu gosto". Só quem for muito idiota pra num saber que eles já botaram os juros no preço. Ainda mais com esse jurão da praça. Por isso eu digo, o pobre continua levando mais ainda no lombo. E uma pessoa lá na reunião disse assim: E agora também no "traseiro". Que o Presidente do Brasil disse que o problema do juro era da população que num mexia o traseiro pra ir nos Bancos."

" Minha amiga, o pessoal tá meio revoltado. É melhor deixar o traseiro do povo em paz. Quem quiser mexer e dar traseiro pra FMI, pra Banco e agiota internacional pode continuar, mas o povo tem vergonha na cara. Por isso o pessoal decidiu ir de mochila e de cartaz pra Marcha do Sem-Terra, contra a política econômica do governo e contra a política de Reforma Agrária, que diz que faz e não faz. É a única forma no Brasil que vale a pena mexer o traseiro: participar de movimento pra que o Brasil mude. Viva os Sem-Terra, viva o movimento social! Até loguinho, vou ver se lá da Esplanada dá pra se comunicar."

Que os traseiros se mexam realmente por uma boa causa, Valdenira! Avante!!!

 

 01 /05/2005

 
Colunista: Verônica M.Mapurunga de Miranda
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