ZOANDO NA CAATINGA |
VALDENIRA NA TRANSIÇÃO |
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Valdenira é uma paraibana do semi-árido, vivendo na confluência de vários Estados. Ela é da base da base. Não tem computador e me telefona sempre para dar notícias e falar suas impressões sobre muitos assuntos que afetam os brasileiros da caatinga, de todo o país e agora também do planeta. Coloco aqui sua fala e discuto com ela suas idéias, às vezes muito radicais e críticas, mas quase sempre cheias de razão e divertidas. Depois de um longo tempo afastada ela reapareceu. As tarefas da transição planetária mobilizaram muitos corações, inclusive aqueles da Caatinga. São novos tempos, novas tarefas e novos movimentos de transformação. Acompanhe. |
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O grande interesse dos altos cientistas do planeta pelo semi-árido é por causa da grande conexão que o povo da caatinga possui. Sua relação com a natureza, sua resiliência e resistência diante das agruras da vida, mostra qualidades de quem poderá iniciar uma nova civilização nas terras secas, mas perfeitamente em comunhão com a natureza e as forças cósmicas. Até mesmo algumas naves estranhas e não reconhecidas andaram fazendo visitas na calada da noite, para apreciar a noite e as grandes potencialidades do povo sertanejo. Quem vem lá de fora sempre vê os mandacarus em prece, com os galhos ou braços voltados para o céu. Não sabemos se esperando e pedindo chuva ou se irmanando com as forças cósmicas. Pode ser os dois. Daí que a física que tudo quer unificar já está de olho nessas potencialidades. E assim Valdenira chegou com os diálogos sobre a unificação. -Alôzinho, minha amiga, o negócio aqui tá brabo. Eu e meu amigo revolucionário fomo encima, fomo embaixo, saímos e voltamos e o consenso foi difícil. Porque esse pessoal grandalhão, os maiorais, gostam mesmo é de mandar, de tá lá encima ditando as regras e depois inventam uns nomes bonitos pra justificar. Se eu não fosse macaca velha nessas histórias e políticas do semiárido, convivendo com essas raposas felpudas dos políticos podia ser que eu não entendesse nada de poder. Mas, coração de sertaneja não se engana. -Nossa, o que aconteceu de tão grave no semiárido, Valdenira? -Não aconteceu nada ainda. Mas meu amigo revolucionário chegou com umas idéias estranhas. Eu até estranhei e disse assim: Rapaz você tá é com febre? Esqueceu suas teorias políticas todinhas? -Aí foi que eu me assustei quando ele respondeu: Valdenira, essas teorias já não servem mais para essa passagem, para esse umbral que se descortina de uma nova terra, uma nova civilização, uma nova cultura planetária. Não podemos ter mais essas políticas pequenas, encaixadas em partidos, em nações, em países. Temos que pensar grande, como um só planeta, acima de todas as diferenças, olhando para o universo. Temos que unificar, Valdenira. -Minha amiga, eu quase que caio da cadeira. Eu disse: Rapaz, você não tem mais memória, esqueceu o que é unificar por aqui? Chega eu fiquei arrepiada. Minha amiga toda vez que falaram em unificar, nós o povo nos lascamos. Nossos avós e nossos pais contavam a grande novidade que eram os açudes no semiárido. Aí disseram assim: Vamos juntar todos os recursos, unificar os recursos e unificar as águas que é pra servir a todos e a população. Discursinho bonito, meu filho. Aí foi neca de pitibiriba. Nunquinha. As água ficaram para os grandes e os pequenos morrendo de sede. Unificaram as águas, nos açudes, dizendo que todo mundo ia ter direito á água. E tinha quando o dono da fazenda permitia, com condições. Na verdade ele se apropriou das águas com recursos públicos. O povo só teve água quando os recursos, mesmo minguadinho, foi distribuído pro povo fazer suas cisternas, pra colher água da chuva. Aí o povo se deu bem. O contrário de unificar. Aí vamos lá pra história do Brasil. Quando vieram os reis de portugal disseram:Vamos unificar os povos, unificar tudo, pra ser um só país. Aí começou a persiga às religiões, aí começou a persiga às raças, sem respeitar as diferenças do povo, os direitos dos ancestrais e da identidade cultural. Até pouco tempo atrás os índios viviam tudo escondido, sem nem poder assumir o que eram. Os negros sofrendo todo tipo de ataque porque unificaram e o país era país de branco. Mesmo que não tivesse na constituição, mas era feito na prática. Depois disseram: Vamos unificar os açudes, que é pra fazer grandes açudes pra ter água pra todos. Aí botaram a população de várias cidades pra fora de suas casas, destruíram cidades inteiras e quem se lascou foi essa população. E o resultado de tanta água unificada é que o povo continua passando sede e se não fosse as cisternas morriam. Por isso vamos com calma com essa unificação. -Tchauzinho, minha amiga. Vou dormir e sonhar com uma chuvinha boa. Sem unificação. Tchau, Valdenira! Que as política públicas e os maiorais tecnológicos do espaço respeitem as necessidades reais da caatinga!
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Veronica Maria Mapurunga de Miranda - 25.06. 2020 |
Colunista: Verônica Maria Mapurunga de Miranda |
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